A ideia de realizar uma chamada para envios de lambe-lambe pelo correio surgiu logo após a inauguração do MUDDA. Ao olhar para o antrópico e o pós-antrópico, percebemos que nos centros das paredes era spray e tinta cobertas de fungo. Essa expressão em papel era da ordem de poucas, encontrada nos cantos, atravessada pelas disputas por espaço.
A batalha do MUDDA para fazer a chamada chegar a alguns veículos de divulgação também foi árdua: releases, articulações, conversas em caixas de mensagens, e, de repente, os envelopes começaram a chegar. Aqui vale ressaltar a importância da Data Zero nessa chamada; sem o serviço de caixa postal cedido ao MUDDA, não teríamos recebido os lambes.
É impressionante o que pode chegar pelos correios. Dos mais de 350 lambes que recebemos, surgiram algumas singularidades que nos fizeram repensar:
É a primeira vez que fazemos uma chamada para envio de trabalhos pelo correio, visando a composição de uma galeria que homenageia um outro formato, o lambe-lambe.
A confiança de 130 pessoas em depositar suas obras e aguardar ansiosamente o que seria feito com elas. De fato, fizemos uma chamada muito ampla, com poucos critérios: tínhamos apenas dois, a data limite de envio e que qualquer tamanho e tema fossem aceitos. Claro que não aceitaríamos nada fascista.
O que faríamos com aquele volume de lambíveis? Como seria a colagem? Será no prédio principal? Tudo em um só lugar, mas e o bomb? E o pixo? De lá, sobrou pouco espaço.
A catalogação... Foi mais um desafio. Como registrar, controlar e contabilizar tudo?
A surpresa de abrir uma caixa com desenhos e fotografias, ou recortes é maravilhosa. A cada papel desenrolado de um bolinho de tantos outros, era uma nova surpresa, um riso, um afago aos olhos. Houve trabalhos que nos atravessaram tanto que decidimos individualizá-los para privilegiar.
Para nós do MUDDA, caminhar é importante. E foi caminhando pelo complexo de edifícios abandonados que fomos buscar dar lugar aos lambes. Inicialmente era em um banheiro escuro, ou acima das nossas cabeças. Pensei, "nas pilastras ainda tem espaço", nos rodapés cabem, mas tem fungo. É melhor continuar caminhando. Encontramos! Ali no fundo, passando pela portaria, num complexo de barracos sem janelas e teto, só paredes. Lá onde a Jurupiá fez poesia.
Jardim Jurupiá
A artista Cássia Oliveira, ainda na inauguração do museu, assinou o que logo se tornaria a galeria Jardim Jurupiá. Ali colamos os mais de 300 trabalhos. Um canto particular, embaixo de um jatobá, nas paredes de um barraco sem janelas, onde escreveu a breve frase: "Quem não dorme, não sonha".
Dormi e sonhei que estava em um jardim das artes. Confesso que colar esse tanto de lambe não foi fácil. Durante esse processo, nomear quem sujou as mãos de cola e grude é fundamental. Ao Tio Arte, à Ana Paula Alcanfor, à beta(m)xreis, à Roberta Valentim, ao Glauco Gonçalves e ao Henrique de la Fonte, um muito obrigado por, em conjunto, termos realizado essa grande lambida que culminou em uma colagem diversa.
Játombei! faz alusão ao jatobazeiro frondoso que caiu em um dia de chuva forte. Ele ficava na entrada principal do prédio projetado por Gustav Ritter. Envenenado, não esperou o tombamento documental, tombou na avenida Anhanguera. E, não por acaso, nas dependências do complexo de edifícios da antiga Celg/Seduce, há outro pé de jatobá, fazendo sombra no lugar mais especial que poderia ser o nosso Jardim Jurupiá.
Questões resolvidas
Inteligentemente, lidamos com os desafios que se apresentaram. Cadastramos todos os envelopes e arrobas que nos foram submetidos. Documentamos, em sistema desenvolvido para o MUDDA, as artes, os nomes, os envelopes, registrando informações como localidade e CEP. Estudamos os espaços possíveis para a colagem, numeramos as paredes, colamos e registramos o processo. Demos lugar de destaque aos tesouros que recebemos, pesquisamos histórias e personagens, e, no último dia 4 de agosto de 2024, entregamos a ação proposta.
Viva a ação Játombei! Viva a equipe de muddeologos desse museu único de multiespécies.
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